segunda-feira, 9 de maio de 2011

Ódio evangélico

A internet é campo da sinceridade. É o lugar onde os simpáticos a todo tipo de causa – seja legítima ou não – emitem sua opinião na forma anônima ou até mesmo assinada (mas sempre na segurança do distanciamento virtual). A característica impessoal da internet permite discussões acaloradas em todos os campos, e o meio cristão não está livre disso. Há pouco li um artigo da revista Época sobre a suposta “nova reforma protestante”. O que me impressionou não foi o artigo em si, mas sim a discussão iniciada a partir dele. Anotei algumas expressões que foram utilizadas até por lideranças evangélicas para descrever seus “opositores”:
– ornitorrinco
– morcego covarde
– empresário da(s) fé(zes)
– bando de picareta
– medíocre

E por aí vai. A crentaiada está dando pauladas mútuas nos campos virtuais. E toda vez que encontro situações desse tipo, lembro das palavras de Jesus aos discípulos: “Nisto conhecereis que sois meus discípulos: se tiverdes amor uns pelos outros” (João 13). E aí fico muito, mas muito triste mesmo.
A tristeza vem porque me recordo do século XVI, quando católicos e protestantes das diversas correntes, alinhados a interesses governamentais, se matavam pelo direito exclusivo de pregar o amor de Deus. Definitivamente, a história não nos ensina absolutamente nada. Trocamos as espadas e fogueiras pelos blogs.
Não que eu seja contra o uso da ironia – gosto muito dela e os escritores que a utilizam são meus preferidos. Também não questiono a posição firme contra interpretações dúbias que grassam por aí; é preciso, de fato, se levantar contra esta esculhambação que a pregação brasileira se transformou. Mas o que sinto falta é do tal do amor. Da exortação sincera mas respeitosa, considerando haver do outro lado um ser humano que pensa e sobre cujas motivações eu posso estar enganado.
Parece que cada um de nós tomou nas mãos o chicote e decidiu expulsar os vendilhões do Templo. Que conseguimos, como Cristo, olhar para a alma do outro e identificamos ali a hipocrisia mais hedionda. Acreditamos que somos muito bons de julgamento e não temos qualquer dúvida sobre nossa capacidade de separar o joio do trigo (como se fôssemos nós os habilitados para tanto). Assim, vem nosso veredicto: aquele líder é um ornitorrinco, um morcego covarde, um empresário da(s) fé(zes), um picareta, um medíocre.
Há compaixão nessas palavras? Não. Deus me preserve de algum dia odiar desta maneira.
Crônica escrita por André Daniel Reinke

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